terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O Brasil na Primeira Guerra Mundial WWI

Participação brasileira na Primeira Guerra Mundial (rev 01/nov/2014)


Navios mercantes torpedeados na costa brasileira. Militares brasileiros entrando em combate. Colônia alemã atacada. Espiões alemães presos no Rio de Janeiro. Comboios navais e militares estrangeiros no Brasil. Você está pensando na Segunda Guerra Mundial? Errou. Isso aconteceu na Primeira Guerra Mundial, a guerra que o povo brasileiro esqueceu.

Como também, a maioria esquece ou sequer foi ensinada sobre isso em nossas escolas, que o Brasil vivia uma guerra civil de quatro anos iniciada em outubro de 1912 e que iria terminar apenas em agosto de 1916. Foi a Guerra do Contestado sobre a linha de fronteira entre o Paraná e Santa Catarina. Os números aceitos para o Contestado são 10.000 soldados rebeldes, dos quais houve entre 5.000 e 8.000 mortos, feridos e desaparecidos; e 7.000 soldados do exército brasileiro acompanhados por 1.000 soldados do Paraná e 1.000 mercenários civis, entre os quais houve de 800 a 1.000 mortos, feridos e desertores.

A Primeira Guerra Mundial começou em 1914. As potências centrais, Império Alemão, Império Austro-Húngaro e Império Turco-Otomano partiram para cima da França e da Bélgica. A carnificina de soldados e o impasse foram a tônica do conflito. Para remover a Rússia do combate a Alemanha financia e envia para lá várias lideranças revolucionárias russas que viviam na Alemanha. A Rússia saiu do combate, desenvolveu sua própria guerra interna, a Revolução Russa (Maximalista, depois conhecida como Comunista), deixando de lado o massacre europeu. O último Czar foi deposto em 23 de fevereiro de 1917. E em 6 de abril os Estados Unidos saem da neutralidade e declaram guerra à Alemanha. Uma participação pouco citada é a de tropas portuguesas nos campos de batalha franceses, sob comando britânico: 7.000 baixas lusitanas semi-esquecidas na história. Também quase nada se diz da marinha japonesa patrulhando o Mar Vermelho, Mediterrâneo e parte do Atlântico em navio britânicos que já não possuíam tripulações suficientes.

Em setembro de 1916, o jornal português "O Século" noticiava o alistamento no exército de Portugal do primeiro oficial judeu, Judah Bento Ruah, sobrinho de Joshua Benoliel, fotógrafo tanto de "O Século" como de "Illustração Portugueza." O jornal cita que havia apenas mais um judeu oficial da marinha "dos mais distintos e illustrados", mas não cita seu nome. Esse alistamento foi para ir ao campo de batalha na França na Primeira Guerra Mundial. Portugal levou 30.000 homens aos campos à guerra. Judah Bento Ruah, acabou por ter uma vida fascinante e produtiva. Seguiu o trabalho em fotografia de seu tio e em 13/jan/1917 é o fotógrafo das crianças do "Segredo de Fátima", fotos das mais importantes para os católicos desde então. Depois, se formou em engenharia, trabalhou na África portuguesa, escreveu "Mestiços: Mulatos de Moçambique" nos anos trinta e também escreveu sobre relações étnicas em Ruanda. Faleceu em 1958.

Judah Bento Ruah (meio careca com terno e colete) está ao centro à direita do baixinho de óculos - foto do arquivo português

O primeiro navio brasileiro a ser afundado na WWI foi o cargueiro Rio Branco operado por noruegueses sob bandeira britânica. Navegava em águas restritas e de acordo com a visão de “regras de guerra” da época, o ataque de 3 de maio de 1916 foi considerado legítimo. Os períodos históricos muitas vezes se confundem. A neutralidade brasileira significava comerciar com bloco germânico e com o aliado. O café brasileiro era consumido pelos vários países em combate: representava 53% na pauta de exportações. A borracha participava com 26%. No início de 1917 a Inglaterra determinou um bloqueio às exportações de café alegando o espaço nos navios ser mais necessário para outros insumos exigidos pela máquina de guerra. Numa rápida reação a Alemanha autorizou seus submarinos a afundar qualquer navio numa zona restrita de bloqueio. Navios corsários alemães, naus mercantes disfarçadas e armadas com canhões, também caçavam navios cargueiros no litoral brasileiro. Alguns corsários foram abandonados em nossas costas e bocas de rios.

No início do século 20, o Brasil era tão alinhado à Alemanha que o projeto e construção da linha de defesa da Baía da Guanabara era de engenheiros alemães com canhões, cúpulas blindadas, usinas de força e até blocos de concreto pré-fabricados na Alemanha. A linha dos grandes fortes, hoje monumentos e museus, composta pelo Forte de Copacabana iniciado em janeiro de 1908; Ilha da Laje, no meio da baía, completada em 1906 e Imbuí, em Niterói, inaugurado em 1901, no fim das contas foram um desperdício, pois jamais qualquer país do século 19 para cá teve planos de nos invadir por este ponto. A Marinha Mercante brasileira, desprotegida, é que passou a ser atacada constantemente.

O Brasil permaneceu neutro até o navio Paraná, um dos maiores cargueiros brasileiros, deslocando 4.466 toneladas e carregado de café ser torpedeado por um submarino alemão na região do cabo Barfleur, na França, no dia 5 de abril de 1917: três brasileiros foram mortos. O Paraná tinha bandeira brasileira e a palavra “Brasil”, enorme, pintada no casco. O submarino ainda emergiu e disparou cinco tiros de canhão contra os sobreviventes. A reação popular ocorreu nas áreas de maior concentração de imigrantes alemães. Milhares de pessoas saíram às ruas em Porto Alegre. As manifestações ordeiras rapidamente degeneraram em ataques contra a colônia alemã. A Sociedade Germânia, o Hotel Schmidt, o clube Turnebund e o jornal Deutsche Zeitung foram depredados e queimados. Esse momento é tão significante e esquecido pois os EUA declaram guerra à Alemanha no dia seguinte.

Os jornais em alemão foram proibidos no Brasil. Em diversas capitais houve manifestações menores até o Brasil abandonar a neutralidade. Descendente de alemães e considerado germanófilo, o então Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Lauro Müller convocou uma reunião com embaixadores e representantes de outros países sul-americanos, em Petrópolis, obtendo apoio para uma tomada de posição contra a Alemanha. Poucos dias depois, a polícia descobre uma estação de rádio clandestina alemã, operando em Niterói, cuja missão era relatar o movimento na Baía da Guanabara: a saída de comboios para a Europa e a presença de navios de guerra de outros países, tornando-os alvos para submarinos e corsários.

De 1917 até o final da guerra, 22 comboios de navios mercantes, escoltados por embarcações militares saíram do Rio de Janeiro para a França. A dificuldade em obter navios de escolta levou os britânicos a transformar velhos encouraçados em escoltas de comboios, a aceitar um grupo de destróieres japoneses que operou no Mediterrâneo e ceder contratorpedeiros britânicos para tripulações nipônicas. A história destes 22 comboios brasileiros é varrida como se não tivessem existido e isso não fizesse parte das operações de guerra.

Com forte clamor popular, o governo brasileiro rompe relações diplomáticas com os países do bloco germânico seis dias depois do ataque ao Paraná. Como primeira medida, nossos portos são abertos para a navegação aliada. Rapidamente quatro encouraçados americanos são deslocados para as costas brasileiras. No mesmo decreto o Brasil confisca 42 navios alemães que estavam em nossos portos. Grande parte deles foi sabotado e suas tripulações se tornaram prisioneiras de guerra no Brasil. O contratorpedeiro Maranhão encontrou em Combari, perto de Santos, São Paulo, instalações que poderiam ser uma base para submarinos alemães. Em 20 de maio, o Brasil perde mais um navio mercante: o Tijuca, torpedeado perto da costa francesa. No dia 27 de julho o navio Lapa foi atacado com três tiros de canhão disparados por um U-Boat (submarino) alemão. Um dos navios confiscados, rebatizado de Macau foi interceptado por um U-Boat a 200 milhas da costa espanhola em 23 de outubro. Seu comandante e o dispenseiro foram aprisionados e nunca mais vistos. Em seguida o navio foi torpedeado e afundado.

Rui Barbosa, o mais importante político da oposição discursou afirmando que o abandono da neutralidade não era suficiente e questionou se a vida dos brasileiros era menos importante que a vida dos americanos, pois já tinham declarado guerra à Alemanha. A pressão do público contra a Alemanha aumenta e o presidente Wenceslau Brás declara guerra à aliança germânica em 26 de outubro de 1917.
1917 - Pres Wenceslau Bras assina a declaração de guerra à Alemanha – foto cedida para esta matéria pelo SDM – Serviço de Documentação da Marinha do Brasil

Ao longo do conflito alguns imigrantes franceses voltaram do Brasil para se alistar nas forças francesas e participaram de combates. Seu número não é conhecido. Brasileiros natos também lutaram no exército francês e sequer seus primeiros nomes têm registro. No cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro, há um mausoléu para 98 destes homens, cinco deles brasileiros natos mortos em combate e vários deles judeus. Memorial da AFAC.
 
 

Já existia no Brasil a força aérea da Marinha com aviões de patrulha e reconhecimento. Oito pilotos, sete da Marinha e um do exército foram para a Inglaterra e receberam treinamento de combates, passando a ser nossos primeiros, e também esquecidos, pilotos de caça. O tenente Possolo morreu em uma colisão com um avião pilotado por um inglês, sendo nosso primeiro piloto a perder a vida. As coisas se cruzam quando nosso Grande Templo Israelita, recebe sua pedra fundamental, lançada pelo presidente da república, exatamente na esquina da rua Tenente Possolo. Completado o treinamento, nossos pilotos integraram uma esquadrilha com americanos e ingleses e participaram do conflito até seu final. Brasileiros também participaram com um hospital de campanha com 92 médicos, dez deles militares, mas todos incorporados ao exército com patentes de oficiais. Havia ainda farmacêuticos, pessoal de apoio e soldados brasileiros para a segurança das áreas hospitalares. Esse contingente foi importante quando o surto de Gripe Espanhola atingiu a população civil francesa
Alguns dos pilotos de combate da aviação naval brasileira que participaram da Primeira Guerra Mundial em foto oficial durante treinamento na Inglaterra - foto cedida para esta matéria pelo SDM – Serviço de Documentação da Marinha do Brasil

Da esquerda da foto para a direita: Lauro de Araujo, Heitor Varady, Eugenio da Silva Possolo (o tenente Possolo (morto em ação) que dá nome à rua onde funcionava do Diário dos Sports e o Grande Templo Israelita do RJ, Virginius Brito de Lamares, Olavo de Araujo, Manoel Augusto Pereira de Vasconcelos e Fábio de Sá Earp.


















Antes da criação da D.N.O.G. (Divisão Naval em Operações de Guerra), oficiais brasileiros foram enviados em missões de combate nas frotas inglesas. Um deles chegou a participar da emblemática Batalha de Jutlândia. Em terra, oficiais do exército entraram em combate. O tenente José Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, comandou pelotões de cavalaria francesa de três regimentos diferentes. Um deles uma pequena unidade do 504o Regimento de Dragões, equipados com os primeiros tanques de guerra franceses: os Renaults FT-17. Ao voltar ao Brasil com o relato da nova maravilha dos campos de batalha, o país comprou um lote de 12 unidades de tanques FT-17 e o Marechal Albuquerque é conhecido como o pai das forças blindadas brasileiras.

A D.N.O.G. foi criada dia 30 de janeiro de 1918 comandada pelo contra-almirante Pedro Max Fernando Frontin (foto ao lado) como parte das forças britânicas. Seus navios eram os cruzadores Rio Grande do Sul e Bahia, os contratorpedeiros Piauí, Rio Grande do Norte, Paraíba e Santa Catarina, o tender Belmonte e o rebocador Laurindo Pitta. Este, ainda em atividade fazendo agradáveis passeios turísticos pela Baía da Guanabara. Curiosamente os encouraçados muito bem armados e submarinos modernos que o Brasil operava, não fazem parte da D.N.O.G.

Praticamente todos os navios eram de última geração, adquiridos em 1910, mas com tripulações pouco treinadas e problemas por falta de testes e uso. A D.N.O.G. recebeu a missão de patrulhar o Atlântico buscando submarinos alemães na região entre Dacar na costa africana, o Arquipélago de São Vicente e o estreito de Gibraltar, única saída do Mediterrâneo para o Atlântico. Na Primeira Guerra, a Itália e o Japão eram países aliados, mas a Turquia e todo o seu império no Oriente Médio fazia parte do bloco germânico. O efetivo era de 1.502 homens: 75 oficiais de armada, 4 médicos, 50 oficiais de máquinas, 5 oficiais comissários (intendentes), um farmacêutico, um dentista, um capelão, um sub-maquinista, 41 suboficiais, 43 mecânicos, 4 auxiliares de fiel, 702 marinheiros, 481 foguistas, 89 taifeiros, um padeiro e três barbeiros.

1918 - Pres Wenceslau Bras a Almt Frontin em foto oficial antes do embarque. Atrás vemos os assistentes do almirante, capitães-tenentes Jorge Dodsworth (esq da foto) e Manuel Bricio Guillon - foto cedida para esta matéria pelo SDM – Serviço de Documentação da Marinha do Brasil

Naquela época o oficialato era composto por brancos enquanto os marujos, sargentos e suboficiais eram quase todos negros. No dia primeiro de agosto de 1918 a D.N.O.G. inicia suas atividades, saindo do porto do Rio. Nas palavras do Almirante Frontin: “Cada homem, em cada navio, sabia exatamente o que fazer nas emergências. A guerra, na verdade, iria começar.” Na noite de 25 de agosto, patrulhando a região entre Dacar e Freetowm foi atacada por um submarino alemão. Não houve danos ou baixas.
1918 – Cruzador Bahia em ação na DNOG. Note que é um navio de guerra que sequer possui torres de canhões voltadas para a frente ou para trás, podendo atirar apenas com canhões laterais de calibre modesto, nave totalmente anacrônica para o conflito - foto cedida para esta matéria pelo SDM – Serviço de Documentação da Marinha do Brasil.




Mas 1918 foi o início da terrível Gripe Espanhola, que ceifou a vida de 20 a 40 milhões de pessoas. Os dados não são precisos devido a falta de estatística oficial em países como China e no sub-continente indiano. Os jornais brasileiros tinham notas de primeira página com o número de mortos diários vítimas da "Peste." Uma das notícias é curiosa: "Peste: ninguém morreu ontem em Niceteroy." Dá para imaginar o terror da epidemia. A frota brasileira não escapou e precisou ficar imobilizada por dois meses no porto de Dakar, onde 156 marinheiros faleceram e mais de 300 ficaram incapacitados temporariamente.

Alguns historiadores citam essas baixas como uma vergonha, como algo que pudesse ser evitado. Mas são baixas de guerra. Só como comparação, 80% das mortes da frota americana foram devidas à gripe. Nossos marujos, incluindo sete oficiais, um deles médico e quatro suboficiais foram sepultados em um cemitério específico em Dakar. Em 1928 seus restos mortais foram trazidos para solo brasileiro e estão no mausoléu aos heróis da D.N.O.G. no cemitério São João Batista, logo atrás do mausoléu da família Aranha, onde repousa o inesquecível chanceler Oswaldo Aranha. A D.N.O.G. conseguiu se juntar à esquadra britânica apenas 48 horas antes da assinatura do armistício que pôs fim à “guerra para acabar com todas as guerras”. Voltou ao Brasil após uma visita de boa vontade à Inglaterra.

Cemitério brasileiro da DNOG em Dakar - foto cedida para esta matéria pelo SDM – Serviço de Documentação da Marinha do Brasil – sem data, tirada provavelmente pela equipe que providenciou a exumação e traslado em 1928. Os restos mortais do brasileiros mortos me serviço na Marinha, na WWI estão no cemitério de São João Batista, em Botafogo, no Rio de Janeiro (abaixo).


Compensações ao Brasil no Tratado de Versalhes

Essa pequena participação brasileira rendeu frutos pouco conhecidos. Uma grande delegação de diplomatas brasileiros participou da Conferência de Paz de Paris que deu origem ao Tratado de Versalhes, onde a Alemanha foi obrigada a pagar pesadas indenizações por ter iniciado a guerra.

Nosso representante na mesa de Versalhes foi Epitácio Pessoa. Depois seria presidente do Brasil de 1919 a 1922. Pelo Tratado, o Brasil recebeu pagamento com juros pelo café perdido com os navios afundados e ainda incorporou à frota brasileira 70 navios do bloco germânico apreendidos em águas e portos brasileiros. Na esteira dessa participação na Primeira Guerra Mundial e de sua diplomacia, o Brasil foi um dos fundadores da Liga das Nações, entidade que faliu após o Brasil se retirar dela. Após a Segunda Guerra Mundial foi recriada como Organização das Nações Unidas, também com participação decisiva do Brasil

Cidadãos brasileiros e estrangeiros no Brasil

Logo nos primeiros meses da WWI os estrangeiros e naturalizados brasileiros, militares da reserva em seus países se apressaram em se voluntariar nas embaixadas. Os diplomatas organizaram embarques destes voluntários. O primeiro grupo foi de franceses, cujos nacionais estavam em peso na sociedade do Rio de Janeiro, inclusive vários judeus. No cemitério de São João Batista, no Rio de Janeiro, há um mausoléu para o ex-combatente francês, onde os nomes do brasileiros tombados defendendo a bandeira da França estão eternizados. Vários dos mortos são judeus e alguns não possuem nem nome nem sobrenome francês indicando que havia brasileiros sem ligação com a França que foram à guerra. O destino de franceses e judeus franceses está intimamente ligado. Não se sabe mais exatamente sobre estes voluntários, os nomes de todos, suas patentes e seus destinos, pois em 1957 desabou um prédio no centro do Rio de Janeiro, que abrigava, entre outros, a Associação do Ex-Combatentes Franceses e a Biblioteca Bialik, que armazenava praticamente todo o acervo de documentação e fotos da imigração judaica para o Rio de Janeiro e de suas instituições. Todos os documentos, livros e fotos, foram perdidos e, lamentavelmente, 30 pessoas faleceram no desabamento, incluindo o presidente da biblioteca. Por outro lado, o dono judeu de uma confecção que ocupava um andar inteiro e tinha mais de 130 funcionárias, após o prédio estalar, ordenou que todas fossem embora para casas, o que as salvou e minimizou o número de mortes ocorridas pouco menos de três horas depois.

Sabe-se pela análise dos jornais que o mesmo perfil de brasileiro lutou pelas cores italianas e inglesas. Quando Portugal entrou na guerra, pelos Aliados, a colônia portuguesa fez vários eventos de apoio e levantamento de fundos e também enviou seus filhos para a carnificina.

Em 2015, em contado com historiadores da ABEC - Associação Brasileira de Estudos Cemiteriais, foi constatado que brasileiros de origem alemã e imigrantes alemães ainda não naturalizados foram à Alemanha lutar por seu país. No Cemitério Luterano de Friburgo existem túmulos bem identificados da vários destes soldados e também túmulos de tripulantes da Marinha Mercante alemã dos navios arrestados pelo Brasil. Nos estados do Sul brasileiro, nas áreas de colonização alemã também há bom número de túmulos de germano-brasileiros que lutaram e morreram nos campos de batalha da Primeira Guerra Mundial. Em relação a austro-húngaros no Brasil, ainda não foi possível encontrar qualquer documentação.

Recentemente entendeu-se que russos imigrados para o Brasil, e entenda-se aí também os poloneses e algumas outras nacionalidades, e que eram reservistas, foram oficialmente recrutados no Brasil. A Gazeta de Notícias de 4 de maio de 1915, traz uma nota emblemática: "O consul russo no Rio de Janeiro publicou a 20 de abril um edital chamando ás armas os reservistas. Gozarão, dizia ele, dos favores do art. 48 da lei militar, excepção feita das pessoas da religião israelita!" Mas isso não traduzia o que acontecia em solo pátrio onde o número de judeus que serviu ao exército russo e polonês era enorme. Podemos traduzir isso como algo: estes judeus que foram embora da Rússia, que não voltem.

Se você quiser compreender e enorme vulto da participação dos judeus na Primeira Guerra Mundial, já que eles habitavam praticamente todos os países em conflito, sugiro a leitura desta outra matéria, A Guerra Dos Judeus, onde você poderá encontrar muitos dados a análise por país no conflito. Se você já ouviu falar de 100.000 judeus combateram pela Alemanha na WWI, saiba que isso é apenas a pontinha da história. No total, 55% da população adulta masculina judaica do mundo esteve em armas e uniformes na WWI.

Após o Brasil sair da neutralidade houve várias campanhas de arrecadação de fundos para a Cruz Vermelha. A Companhia Israelita de teatro de Heyman Starr promoveu eventos beneficentes. A Sociedade Beneficente e Funerária Israelita (das Polacas) e a União Israelita levantaram fundos entre a comunidade e os enviaram à Cruz Vermelha.

Os judeus brasileiros foram e voltaram (ou não) da guerra sem despertar maior interesse. Mas em 9 de outubro de 1918, chegaram ao Rio, de passagem, 52 voluntários judeus uniformizados do 52o Batalhão de Caçadores do exército argentino. Só que a Argentina nunca declarou guerra à Alemanha e não se sabe o que foi feito destes homens. O jornal "A Epoca" é contundente: "Foi de uma imponência fóra do commum a manifestação de carinho promovida pela colonia israelita aos voluntários seus patrícios vindos de Buenos Aires...

A Associação Sionista do Rio de Janeiro preparou uma acolhida digna aos destemidos voluntários que desembarcaram em meio das mais vivas acclamações." Foi uma recepção que surpreendeu a cidade. Existe o mito da pobreza dos imigrantes, mas não desta leva da primeira década, tanto que a comunidade compareceu no porto com 132 automóveis (seria sem precedentes até mesmo nos dias de hoje) "muitos com bandeiras dos alliados e outros com as de sociedades israelitas." Levando os soldados judeus do Cais do Porto para a sinagoga Tiferet Sion, dirigida pelo emblemático David José Perez. No salão da sinagoga foram recebidos por parte da comunidade, cantaram "Hatikva" (letra antiga) em conjunto. Em nome dos judeus árabes do RJ, discursou em árabe o "sírio sr Aron Atia" que cantou com todos o "Hymno Israelita" (não sabemos o que possa ser).



09-out-1918 – Publicado pelo jornal Revista da Semana – arquivo pessoal

Os jornais nos deixam conhecer os nomes de alguns destes judeus. Falaram pelos voluntários argentinos o soldado Gustavo Adolpho Buhler, o tenente Wladmir Herman e um jornalista judeu chamado D.M. Menchez, engajado como soldado. Também falaram os outros membros da diretoria da Tiferet Zion, Jacob Schneider, Sinnai Faingold, Boris Tcholrnei e Tuli Sensler.
09-out-1918 – Publicado pelo jornal A Epoca – arquivo pessoal

Dois dias antes temos um registro curioso da Sociedade Israelita Shel Geumilut Hassadim doando 250$000 "para as primeiras 25 viúvas pobres que se apresentassem" ao jornal "O Imparcial." Eram as "viúvas da peste, ou da Gripe Espanhola. A quantia foi obtida durante a festa de Simcha Torah daquele anos. Outros judeus, se cotizaram e obtiveram mais 600$000 entregues para a Cruz Vermelha na mesma ocasião.

O período da Primeira Guerra Mundial é um período importante para o Sionismo. Vários movimentos no Brasil, a Revolução Comunista, a Declaração Baulfour e a libertação da Palestina do domínio muçulmano turco. Também é um período com intensa perseguição antissemita em vários países europeu dentro e fora da guerra, começam a culpar os judeus pelo comunismo, mas isso é tema para outra matéria.

Bibliografia
PRADO, Maia. D.N.O.G. – Uma página esquecida da Marinha Brasileira. Publicação da Marinha do Brasil, 1961.
FROTA, Guilherme de Andrea. 500 Anos de História do Brasil. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 2000.
EISENSTEIN, Douglas R. . Whispers in the Wind. Xlibris Corp.
MACDONALD, Lyn. 1915, the Death of innoncence.
PARET. Henry Holt Peter. Construtores da Estratégia Moderna. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora
MARTINS, Helio Leôncio, História Naval Brasileira vol V tomo I. Serviço de Documentação da Marinha
KEEGAN, John. An Illustrated History of the 1st World War. Knopf Corp.
TAYLOR, A J P. The First World War - An illustrated history. Penguim Books
HAUTHORNTWAITE, Philip J.. A photohistory of World War I. Brockhampton press

Agradecimento ao SDM – Serviço de Documentação da Marinha do Brasil cuja ajuda e compreensão permitiu o resgate deste momento histórico com ilustrações.

© 2012 – José Roitberg – jornalista e pesquisador
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